segunda-feira, 18 de outubro de 2010

O ódio, o sentimento de posse e a vulgar ingratidão da classe média

O presidente Lula faz uma leitura correta quando diz que  as elites o odeiam e transferem este ódio para Dilma. Mas  há algo além disso. Há um ódio difuso e generalizado por tudo o  que vem  de baixo e ameaça   não apenas  seus privilégios, mas suas posses elementares. A burguesia, (na verdade o rosto do Capital) como classe que controla  o processo de produção e o processo político que ela chama de democrático, mas sobre o qual ela detém  o controle absoluto, odeia tudo que ameace  essa hegemonia.
  Tudo que conteste esse poder absoluto  que impõe como cláusula pétrea, a posse da  terra e dos meios de produção, é considerado crime contra o gênero humano, subversão pura e terrorismo. Era assim na Idade Média, quando a rebelião dos servos era apontada como uma rebelião contra Deus. Foi assim  na escravidão moderna, quando a rebelião  dos  negros era considerada uma  anomalia e a subversão  da genética.
Luiz  Fernando Verrisimo diz que o ódio das  elites contra Lula é  sinal de que  elas não se  conformam com o fato de um operário, um sapo barbudo, ter ficando com a princesa.  É uma explicação  inspirada e inteligente. Mas há muito mais do que isso.
Há o medo que é  o principal acicate do ódio e do rancor. No fundo eles sabem que são privilegiados e injustos.  Alguns de seus rebentos percebem  isso claramente e solidarizam-se com os colonos da fazenda (hoje bóias frias), com operários e com os excluídos. Na verdade, 99,9% dos homens que  teorizaram e  lideraram as revoluções  nos Séculos XIX e XX,  de Marx a Che Guevara, tiveram seus berços na classe média.
Me vem à lembrança, agora, esta  historinha dos aos 50: Getúlio, então presidente, pediu ao Ricardo Jafet, a quem ele colocara na presidência do Banco do Brasil, que promovesse uma reunião (tipo bate papo informal) com os principais empresários de São Paulo.

Javet  cumpriu ordem, houve a reunião é, à noite, Getúlio escreveu em seu diário: “Burgueses idiotas. Eu querendo ajudá-los e eles ainda fazem cara  feia”. Se lula tivesse um diário poderia dizer o mesmo, quase que com as mesmas palavras, apesar das diferenças de época e do feitio pessoal de cada um. Os burgueses sevaram-se em seu governo, mas não deixaram de odiá-lo. Gente ordinária.
Mas  o que importa é dizer que, ao optar por ser um partido de massas (de centro-esquerda e não revolucionário), O PT foi obrigado a  sintonizar-se  com as  aspirações, valores e com a  ideologia (porque não) da classe média, hoje  largamente majoritária neste Brasil emergente, pelo menos de Minas para o Sul.
É claro que um partido de centro esquerda,  social democrata que foi no que o PT se transformou, é muito melhor que a Direita fascistóide em que se transformou  o PSDB em aliança com o DEM. Mas este não é o cerne  da questão.
Tudo isso para  dizer que quem governa com e para a classe média  não pode esperar  nada dela: reconhecimento, compreensão e muito menos gratidão. E isto explica, em parte, porque 80% dos eleitores aprovam  Lula, mas só 50% votam na Dilma. Egoísta, utilitarista e hipócrita, a burguesia tem como  Norte a grana. O resto é perfumaria. E é certo que  os estratos inferiores da classe média (a pequena  burguesia) macaqueia  os modos, gestos, roupas  e jeito de comer, dos extratos superiores. Da mesma forma que estes últimos macaqueiam os hábitos, costumes, etc.,  das elites européias e norte-americanas. E por ai vai.
Isto que  dizer que há que procurar novos  caminhos revolucionários, mais além do leninismo que foi bom há cem anos, mas que atualmente não faz o menor sentido, até porque, nesta fase crepuscular do capitalismo, burguesia e proletariado, vão  perdendo paulatinamente as características de personagens  centrais do processo. A teoria marxista precisa se atualizada (não reformada).  Mas nossos “teóricos e formuladores” ainda  se  limitam a repetir palavras de ordem do velho Lênin.
Enfim, com todos os seus defeitos, o chavismo  é pelo menos uma tentativa materialmente consistente de se encontrar um caminho alternativo para o  socialismo do Século XXI.  Aliás, é preciso recordar que no início do Governo Lula, no lançamento do  Fome Zero se realizou uma tímida tentativa  de implantação de um “poder paralelo” com a criação de Conselhos de Base no municípios, distritos e  sindicatos. O objetivo era o de distribuir  as cestas básicas.
 Mas poderia ter sido um plano piloto para a implantação dos Conselhos nas universidades e grandes empresas, o  mesmo  valendo para as áreas de segurança. Tudo consiste em derrotar a “democracia burguesa” em seu próprio terreno, desmoralizando a sua farsa. Grande parte disso já foi feito na Venezuela, o que poderá garantir a irreversibilidade do processo.
 O problema  é que a própria militância petista   raramente pensa em aprofundar esses temas cruciais. A maioria, infelizmente (e isso é bem visível no Twitter) limita-se a  igualar-se   aos serristas e cair na  vala comum dos xingamentos e da  disputa grotesca  para aferir  qual dos lados possui mais ladrões. Não só a sociedade brasileira como o próprio PT estão passando por um  cruel processo de despolitização.

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